TORNAR-SE MÃE. A maternidade preenche. No início, não ocupa tanto espaço assim, ainda tomando forma e emprestando curvas suaves ao nosso corpo. Enquanto os dias passam, nosso corpo é preenchido, a fisiologia modificada. Cada parte nossa se acomoda para a maravilha biológica que é o desenvolvimento de um filho no corpo materno. As semanas avançam no tempo, e reconhecemos nosso filho além das novas curvas quando percebemos, pela primeira vez, seus mergulhos e rodopios em nosso ventre. O filho aos poucos preenche nossos planos, dá significado e assunto para nossas conversas, ocupa nossas preocupações. Um corpo agora completamente diferente se prepara para dar origem a outro ser, e isso por enquanto é só detalhe: não imaginamos que esta é apenas uma entre tantas transformações da maternidade (falarei mais sobre mudanças no corpo em outro post!).
Do final da gestação, lembro da minha barriga pesada e pontuda de Antônio. Sozinha, eu acariciava a barriga, tentava imaginar em qual posição que ele estaria naquele momento (seriam os pés ou o topo da cabeça me incomodando junto às costelas?). No banho, cantava músicas infantis e histórias, tentando me conectar com o filho que crescia em mim. À noite, lia partes de livros que se amontoavam na cabeceira da cama sobre gestação, sobre bebês e maternidade. Sempre achei que deveria conversar mais com ele na barriga, que deveria cantar mais, saber mais coisas, fazer mais carinho, já ser mãe. Mas mãe não nasce de uma hora pra outra, e tampouco nasce no parto. Sinceramente, acho que algumas mães nunca se tornam mães, no amplo sentido da palavra. Me parece que nos tornamos mães aos poucos, nos descobrimos como pessoa sob este 'título', ou 'status' permanente. Não existe cartilha pra ser mãe. Apesar disso, a rede que existe à nossa volta, nos molda e auxilia a vivenciar e exercer a maternidade. O que isso quer dizer exatamente? Que as nossas mães, e suas mães - e em muitos casos outras mães e pais, ou amigos - acolhem as recém-mães, para que possamos descobrir com tranquilidade o nosso bebê e o poder da maternidade. Este acolhimento social, na maioria das vezes familiar, é fundamental nas etapas iniciais de ser mãe. Lembro dos primeiros dias do Antônio, e da minha preocupação em acertar as mamadas (em qual seio ele mamou da última vez?), aprender a dar banho, ouvir o choro baixinho, acomodar para dormir (às vezes, nível HARD). Sobre as primeiras semanas, tenho a lembrança viva do carinho e cuidado com os quais a nossa pequena família foi envolvida - eu, Marcus, Antônio e Mel - como uma neblina de conforto para que os dias fossem só nossos. Foram cuidados com o nosso almoço e jantar, com a limpeza da casa, a água do banho do bebê, e com o sono dos pais. Amparados por uma rede de amor e afeto, minha avó e minha mãe me mostraram como segurar meu filho da melhor forma durante os primeiros banhos. Quanta habilidade e cuidado naquelas mãos experientes. Em outro episódio marcante, numa simples troca de fraldas, minha tia disse: "mamãe, conversa comigo, pergunta como eu estou", me estimulando a conversar com o meu bebê agora do lado de fora da barriga. Eu nem havia notado que não conversava com ele! (e 1 ano e meio depois já travamos tantos diálogos). Dentro desta rede que acolhe o choro vira motivo para canto e embalo no meio da madrugada, a cólica é motivo pra colo e calor, o sono é zelado com amor e reza, roupa suja com cocô é saúde, e cada mamada é justificada pelo 'querer' cheiro da mãe. São gerações de mães alinhadas, de nossos antepassados, nos cercando com sua experiência, estendendo a mão para que as novas mães e famílias descubram a maternidade. Esta rede, como eu chamo, nos orienta ao longo do caminho. Em tempos de cuidado excessivo para que o outro não invada o nosso espaço (existem inúmeros exemplos de posts reclamando da intromissão de avós e familiares), é necessário reconhecer a importância daqueles que compartilham conosco a chegada de um bebê. A presença e o cuidado das avós fortalece as mães para que cuidem do filho com maior segurança. Não estou dizendo que nossas mães, avós e pais devem ditar como devemos cuidar de nossos filhos, mas que contar com sua ajuda e experiência pode nos ajudar a descobrir mais ternura, afeto e paciência em nossos próprios cuidados. A paciência dos meus pais comigo e com o meu filho (e suas manhas) me inspiram a ser mais paciente e amorosa quando necessário. Nos preparamos durante meses para a chegada de um novo ser. Cuidamos da casa e do enxoval, das idas ao médico, do preparo para o parto, do yoga e da alimentação. Devoramos livros e conteúdo na tentativa de compreender a transformação de ser mãe, muitas vezes sem saber que 'ser mãe' é um processo. É um tornar-se mãe: experimentar a maternidade no dia-a-dia preenche a nossa vivência como mães (e pais). Somos preenchidas pouco a pouco de maternidade, mesmo depois da gestação, e daquele barrigão pesado. Ao longo desta caminhada, uma rede familiar, de gerações de mães (e inclusive pais), nos dá suporte para trilhar a maternidade seguras de nós mesmas, descobrindo aos poucos o poder de ser-mãe. Eu já sou a mãe do Antônio, mas se ele puder ter uma mãe melhor a cada dia, porque não me apoiar nessas mãos experientes? Pensa nisso! Até a próxima, Mariana. Mãe linda, feliz dia das Mães e obrigada por me guiar nessa montanha-russa de sensações com toda a paciência de ser mãe. Pai, vovô Pedro, feliz aniversário amanhã. Obrigada por serem da nossa rede de amor.
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Contando histórias para crianças. Quando se tem uma criancinha de quatro anos perguntadeira e curiosa em casa, todos nós mães e pais, nos tornamos contadores de histórias. Eu sou cientista, sou poeta e sou mãe. De certa forma todas essas facetas estão adormecidas dentro de todos nós. Quando experimentamos, quando filosofamos e quando cuidamos da nossa cria. Eu nunca me esqueço do dia em que senti meu corpo diferente do normal. Hoje lembrando deste dia em que descobri que uma vida crescia dentro de mim, até parece que o sol brilhava mais forte. Uma plenitude, uma alegria intensa. Claro que eu não sabia dos desafios. Claro que eu não sabia que ser mãe não é sempre fácil, mas isso já é outra história. Desde deste dia eu comecei a falar com meu bebê, contar para ela sobre a minha rotina, descrever para ela o mundo. Eu cantava no chuveiro, eu contava histórias. No caminho do trabalho eu cantava e contava o mundo para ela. Até o dia em que ela nasceu. Essa história realmente começa com as inúmeras noites tentando colocar uma menininha muito ativa para dormir, foi então que eu comecei a inventar histórias mirabolantes. Eu queria que ela entendesse o mundo muito além das velhas histórias dos contos de fadas. Eu queria que ela visse o mundo além do vilões e mocinhos, além dos estereótipos impostos pela sociedade. Eu gostaria que ela tivesse a chance de ver o mundo como eu via, a natureza e a beleza dos fenômenos naturais mesmo sem perder a fantasia. Entre cogumelos, caramujos e sapos eu comecei descrevendo para ela os bichos e seus hábitos de uma forma divertida e, ao meu ver, pouco convencional. Ela sempre prestando atenção com seus olhinhos redondos de curiosidade. As vezes nem parece que ela está ouvindo o que eu digo, mas dias depois ela comenta algo que me remete a uma conversa que tivemos ou uma descrição de um fato que vimos juntas. É reconfortante. Ela é sempre minha inspiração. “Olha mãe, o ‘bicinho’!” – Assim mesmo com ‘c’ e não ‘ch’. “Por que ele tá voando?”, “O que é o tovão?” – ‘Trovão’ Coisa mais fofa do mundo! Como não amar? Ela ama besouros, minhocas e borboletas. Tem problemas filosóficos com os mosquitos e as baratas. E tem fascinação por plantar todas as sementes que encontramos pela frente. O planeta favorito dela é júpiter e ela só tem quatro anos. Foi explicando para ela sobre os planetas (o pai dela, o Cris, tem muita responsabilidade nessa paixão pelo universo) que escrevi a história da Coruja professora de astronomia. Foi porque ela ama plantar plantinhas que eu escrevi para ela a história da do Seu Minhoca que mantem a terra bem fofinha e do Cogumelo com seu micélio que ajuda a comer as folhas velhas. E foi porque ela adora borboletas que eu escrevi para ela a história da Borboleta Marieta e sua descoberta da metamorfose. Estamos sempre caminhando juntas e trazendo ‘tesouros’ para casa. Os tesouros dela são galhos, flores e pedras, os meus são memórias e sorrisos. Uma vez ela trouxe uma comunidade inteira de fadas imaginárias para morar no guarda-roupas. Aposto que elas ainda estão por lá! Às vezes o tesouro dela é um inseto morto muito interessante. E são nessas caminhadas cheias de perguntas e comentários inocentes que ela me leva para esse mundo de curiosidade infantil e me faz querer explicar o mundo para ela. Eu acredito que há muito além dos contos de fadas para as crianças. Que elas precisam interagir e entender o mundo real, mas essa descoberta não precisa ser ‘séria’ ou ‘rígida’. Essa descoberta pode ser cheia de fantasia e imaginação. Adoro poder aproveitar o potencial das crianças para misturar realidade com fantasia. Afinal, eles são crianças. Nosso passatempo favorito é a leitura. Ela adora ouvir as histórias lidas por nós. Tentamos na medida do nosso cansaço ler todos os dias para ela. Tem livros que ela gosta mais que outros e alguns deles ela até decorou as palavras de tanto ouvir. Eu não me incomodo em ler o mesmo livro muitas vezes. No final das contas, ela conhece os personagens e entende suas motivações. Eu percebo que, para ela, eles todos existem. Eu não me preocupo em explicar que na verdade eles são apenas histórias. Deixe que existam em sua cabecinha cheia de sonhos! A exceção foi o lobo-mal, que foi apresentado na escolinha e que tivemos que desmistificar para nossa sanidade noturna. A maioria das pessoas não se dá conta de como as histórias impactam as crianças. E como é preciso pensar bastante no conteúdo que oferecemos para elas. Mas esse papo de colocar medo nas crianças, é tema para outra vez. Todas as crianças são curiosas e inventivas e para todo ‘Porque’ tem uma resposta. Mas mesmo que você não seja um contador de histórias, arrume um tempo para ouvir as perguntas e os pontos de vista dos pequenos. Essa conversa é muito prazerosa. A criança descobre o mundo através dos teus olhos, e nós redescobrimos o mundo através dos dela. Eu sempre escrevi poesias e histórias, mas são os olhos brilhantes da Sophia que me fazem querer explicar o mundo para ela. Eu quero que ela sinta vontade de descobrir cada vez mais e que sinta cada vez mais essa curiosidade. E eu tenho extremo orgulho de ser, pelo menos nesses primeiros anos de vida, um dos guias nessa aventura única para ela, que é viver.
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Sobre a autora.Meu nome é Mariana. Sou mãe, bióloga, professora, pesquisadora, dona-de-casa, esposa, de tudo um pouco, não necessariamente nesta ordem. Neste blog, pretendo compartilhar minhas experiências em conciliar a vida de mãe e a vida acadêmica. Outros posts.
May 2018
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