A vida além das mamadas: voltando à ativa (parte I).Dia desses, ainda cedo pela manhã, caminhava a passos largos pelos corredores da universidade quando lembrei dos meus primeiros dias por aqui. Fui invadida por uma sensação já conhecida: o coração palpitando - meio que apertado -, um nó na garganta, e os olhos cheio d'água - ou choro mesmo. A ansiedade da separação. Eram também os primeiros dias longe do Antônio. Lembrei com alívio por já ter passado por esta etapa, mas senti uma pontinha de saudades do meu filhote, que estava em casa. Respirei profundamente entre um passo e outro, soltei o ar de uma vez só, lentamente, e segui caminhando.
Fui nomeada há quase um ano atrás, quando iniciei minhas atividades como docente na universidade. Naquele mês, meu filhote acabava de completar quatro dos seus meses de vida. Ainda estávamos nos conhecendo, acostumados um ao cheiro do outro, às noites juntinhos, aos dias colados, divididos entre mamadas, trocas de fralda, cuidados com a casa, brincadeiras e beijinhos. Ao mesmo tempo que a maternidade crescia em mim e no meu dia-a-dia, era necessário interromper todas aquelas sensações, e de certa forma suspender o elo que crescia entre eu e meu filho. Eram apenas quatro meses de nós dois. No final daquele mês as aulas já haviam iniciado, e os novos professores deveriam assumir as disciplinas o quanto antes. Nas primeiras vindas para o campus, que fica a uns 10 quilômetros da nossa casa, deixei leite para o bebê na geladeira, e muitas lágrimas no banco do carro. Esgotava o leite na noite anterior, depois de uma mamada noturna, e na manhã seguinte, antes de sair. Com quatro meses os bebês mamam em torno de 120ml de leite por mamada (os volumes variam muito entre bebês). Tinha a preocupação de fazer com que ele se adaptasse à mamadeira, o que era difícil para um bebê que até então só havia mamado no peito. Chorava por deixar o Antônio em casa, por ter que oferecer a mamadeira, por ter menos leite - deixar de oferecer o peito acaba reduzindo o volume de leite produzido pela mãe - e por ele não gostar das mamadeiras! A licença maternidade no Brasil é de quatro meses, ou 120 dias corridos. Isto é, o retorno das mães ao trabalho se dá quando seus filhos estão com quatro meses, sendo alimentados somente com leite. Até completarem seis meses de idade, o leite (materno ou fórmula) será a única fonte de alimento do bebê, depois deste período é que são introduzidas as papinhas. Como alimentar seu bebê de quatro meses em livre demanda, retornar ao trabalho, preparar aulas e ainda ter fôlego para mamadas noturnas e o sono parcelado? Durante algumas semanas, continuei a inundar o banco do carro com lágrimas. Um dia, recebo uma ligação no meu celular: "É a Mariana?". "Sim, sou eu" , respondi. "Sou assistente social aqui da progep (Perícia Médica da Gestão de Pessoas da UFSM)... (cont)... tu tens um bebê pequeno?". "Sim, tenho um filho de quatro meses". Do outro lado, escuto: "Pois é, nós entendemos que tu tem direito a solicitar a prorrogação da licença maternidade". Santa alma salvadora de mães! Depois de encaminhar a documentação, conversar com o chefe do departamento e ter o apoio do colega que dividiria as disciplinas comigo, tive direito a 60 dias de prorrogação da licença, e passei mais dois meses pertinho do Antônio. A prorrogação da licença maternidade é um direito de servidoras públicas (decreto aqui), e uma possibilidade para mulheres que trabalham em empresas "cidadãs" no setor privado - estas empresas tem incentivo fiscal para aderir ao programa do governo. Somente depois de viver a maternidade é que compreendemos a importância da licença e dos direitos das mulheres e cidadãs, ou cidadãos. Neste período delicado, de dedicação e doação completas, de aprendizado, mas que também traz cansaço, é fundamental que possamos estar em família, dispondo do tempo para cuidar de nosso(a) filho(a). Esses 60 dias que parecem tanto mas passam num piscar de olhos. Nos perdemos no tempo com filhos pequenos, não temos muita noção de semana e final de semana, de hora de dormir, acordar ou se alimentar. Quando abrimos os olhos, nosso filho já está comendo as papinhas, arroz, feijão e carne, correndo pela casa e chamando o "papai" quando acorda no meio da noite. Passa tão rápido, mas é tão essencial para nós, mães (mais sobre papais outro dia!). Vivi esses dias de licença pertinho do Antônio, mas ocupada em preparar aulas para o semestre letivo que se iniciava para mim. O dia de pisar em sala de aula chegou logo, e já se passaram quase 365 dias deste então. Estou feliz de ter voltado à ativa, do jeito que deu, repleta de sentimentos e inseguranças, mas com o apoio de muitas pessoas de minha convivência. A licença é muito importante, mas também são fundamentais o suporte de pais, avós, colegas, e amigos. É todo o conjunto que colabora e transforma a vida de mães, pais e filhos. É a sociedade. Existe vida além das mamadas, e tem muito trabalho para nós fora de casa (mais sobre isso em outro post), mas que façamos essa transição de forma leve, sem culpabilidade, pressão, e estresse. Teu filho vai ficar bem, a se vai. Mas tome seu tempo, chore o quanto quiser, enxugue essa lágrima, e caminhe pra frente. beijos e até a próxima.
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Sobre a autora.Meu nome é Mariana. Sou mãe, bióloga, professora, pesquisadora, dona-de-casa, esposa, de tudo um pouco, não necessariamente nesta ordem. Neste blog, pretendo compartilhar minhas experiências em conciliar a vida de mãe e a vida acadêmica. Outros posts.
May 2018
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