A vida além das mamadas: convivendo com a saudade (Parte II)Existe muita vida lá fora, além dos limites do quarto dos nossos pequeninos, além dos nossos lares. Enquanto eu escrevo, consigo me imaginar com o Antônio no colo: segurando ele contra o meu peito, sentindo o cheirinho dos seus cabelos, o cheiro das roupinhas, mas olhando pela janela, escutando a vida que continua logo ali na rua. Criando esta cena em minha mente, sinto conforto, e ao mesmo tempo reconheço a apreensão em ter que deixá-lo. Quantas mães não sentiram ou sentem exatamente a mesma coisa? Voltar à ativa depois de nos tornarmos mães, ainda tomadas pela fisiologia da maternidade, nos obriga a conviver com uma saudade quase que constante. Como lidar melhor com essa saudade de forma mais leve? Eu explico.
Nas últimas semanas conversei com várias amigas-mães sobre este momento que marca a maternidade: o retorno ao trabalho. Também li alguns relatos de amigas, ou conhecidas, compartilhando as sensações e angústias desta etapa. Apesar das diferenças que marcavam cada experiência destas mães, – o retorno à pós-graduação, o acompanhamento dos primeiros dias do filho na creche, a transição do peito para a mamadeira, ou uma prova de seleção – uma coisa é unânime: todas sentem saudade. No início sentimos saudades da presença do filho. Daquele pedaço teu, que ia contigo, e quase que somente contigo, a todos os lugares. Aos poucos sentiremos saudades de amamentar (e essa saudade deve durar para sempre, imagino), saudades do olhar só teu, das risadas, e de ouvir “mamãeiiii” – assim mesmo, com o “i” bem puxado no final. Parece que a saudade vem também vestida de medo, de um receio de não participar do desenvolvimento do teu filho. Nos primeiros anos de vida, são tantas e tão rápidas as transformações que acompanham o crescimento e desenvolvimento das crianças. De bebê frágil e delicado à uma criança esperta e responsiva, que tem vontades próprias, corre pela casa e abre todas as gavetas! Temos medo de não presenciar um riso, uma nova habilidade ao manipular um brinquedo, o ritmo mais veloz ao engatinhar, as expressões faciais ao experimentar um novo sabor, ou o pronunciar de uma nova palavra. Retornando à ativa, em meio à leitura de um artigo, somos sem querer transportadas para o cangote do nosso filho. Em aula, explicando algum assunto, pensamos se eles estão bem sobre os cuidados de outras pessoas: “será que ele já mamou?”. Revisando algum tema de estudo e uma lágrima insiste em cair, ou enchemos os olhos d’água ao contar das últimas deles para um colega. Mas mesmo assim, precisamos retornar. Enquanto nossa mente experimenta todas estas sensações, temos vontade de voltar à ativa. Vida social, trabalho, leituras, cuidar de nós mesmas, quem sabe voltar para a academia? Sentimos saudades de nós mesmas. O que eu quero dizer é que existem os dois lados: mãe 1 e mãe 2. Algumas de nós TEM que voltar à ativa, ou porque a licença maternidade está chegando ao fim, ou porque precisamos tocar um projeto, ou porque sentimos vontade de retornar ao ambiente de trabalho. Outras de nós ainda não puderam voltar, ou porque querem continuar se dedicando integralmente aos seus filhos e lar, ou porque ainda não conseguiram uma oportunidade de trabalho ou uma vaga na creche. Mãe 1 muitas vezes quer ser Mãe 2, e a 2, com certeza também gostaria de estar no lugar da Mãe 1. Acho que o fundamental é aceitar o que temos naquele momento, e aproveitar ele da melhor forma. Se temos que trabalhar, tudo bem, faremos nosso melhor enquanto no trabalho. Se estamos com nossos bebês em tempo integral, ótimo, cuidaremos deles da melhor forma. Não se culpe se tu tens vontade de trabalhar, e quer dedicar teu tempo à isso. Não se culpe se tu tens vontade de estar só com o teu filho, e cuidar dele. Em 2016, grávida do Antônio, viajei para o Havaí para participar de um congresso internacional conhecido entre os pesquisadores de ambientes recifais (o International Coral Reef Symposium). Numa conversa de bar com um renomado pesquisador da área, comentei que estava grávida, e que me sentia insegura com meu futuro como pesquisadora. Sabia que este período de dedicação (exclusiva) ao meu bebê seria de menor produção científica, e que alguns projetos ficariam em stand-by. Ele apontou o dedo pra mim, e disse: “tu pode ser o que tu quiser”. Em meio à conversa ele relatou a opção de sua esposa, de jamais ter se dedicado exclusivamente aos filhos, e de como sua atitude foi mal vista entre seus conhecidos. Ele salientou: “é uma decisão pessoal, e ela teve todo o meu apoio”. Nunca vou esquecer daquele momento, do relato e da força das palavras. É isso: força. Se tivemos força para tantas outras coisas da maternidade (mais sobre força na maternidade em outro post), como não teremos força para dar esse passo, quando necessário? Coragem! Algumas coisas que me ajudaram a retornar ao trabalho com mais tranquilidade, mas ainda sentindo AQUELA saudade do guri:
Beijos e até! P.S: parabéns pelo teu dia papai do Antônio.
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Sobre a autora.Meu nome é Mariana. Sou mãe, bióloga, professora, pesquisadora, dona-de-casa, esposa, de tudo um pouco, não necessariamente nesta ordem. Neste blog, pretendo compartilhar minhas experiências em conciliar a vida de mãe e a vida acadêmica. Outros posts.
May 2018
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